segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

DE MÃOS DADAS NO AUTOCARRO...

Ela entrava no autocarro duas ou três paragens antes dele. Não se conheciam, nunca se olharam nos olhos, o acaso apenas fizera com que fossem companheiros de viagem. Viagem essa que não demorava mais de meia-hora. Ela tinha arranjado um estágio na Câmara Municipal e ele saía duas paragens antes da dela, pelo que ela não sabia qual a sua profissão.

Como viajava ao contrário da hora de ponta o autocarro levava pouca gente. Isso não impediu de uma vez ele se sentar ao lado dela, apesar de haver muitos bancos e muitos lugares vagos nas proximidades - o português não gosta muito de «incomodar» e nos transportes públicos as pessoas que vão entrando vão ocupando os bancos vagos até ser obrigatório sentar ao lado de alguém.

Ele sentou-se ao lado dela, mas não a olhou. Procurou uma das mãos dela e segurou-a... apertou-a! Ela estranhou mas também não fez qualquer gesto para retirar a mão. Assim seguiram. Mais à frente entrou um grupo de estudantes em grande algazarra. Continuaram de mãos dadas! Alguns minutos e algumas paragens depois ele chegou ao destino: retirou a mão, nem olhou para ela, levantou-se, caminhou pelo corredor e saiu...


E todos os dias se repetiu a cena: ele entrava, sentava-se ao lado dela, nem uma palavra, dava-lhe a mão e assim permaneciam todo o tempo da viagem até que ele se levantava sem qualquer despedida.

No princípio ela ficou surpreendida mas com o passar dos dias começou a achar piada à situação e esperava a cada momento uma palavra da parte dele. Embora ele aparentasse ser um bom bocado mais velho que ela não lhe desgostava a ideia de o poder conhecer melhor... além do tacto das mãos!

Assim andaram semanas. O estágio dela, entretanto, estava a chegar ao fim e na segunda-feira da última semana ela resolveu que falaria ela. Nesse dia levou a roupa com que se sentia melhor, tinha ido ao cabeleireiro e achava-se muito bonita - aliás, ela era muito bonita!

Mas na paragem habitual - e pela primeira - ele não entrou. Ela estranhou mas ainda teve esperanças que ele entrasse na paragem seguinte. Mas não, por coincidência nessa paragem entrou outro indivíduo com um jornal na mão que - por azar - se sentaria ao lado dela. Olhou-a de soslaio e ficou a ler o jornal enquanto o autocarro devorava quilómetros e paragens.


Esse indivíduo tocou à campainha na mesma paragem em que o outro estranho indivíduo saia habitualmente. Quando se levantou, deixou cair no banco uma das folhas do jornal. Ela ainda lhe fez sinal mas o indivíduo já ia porta fora. O autocarro arrancou. Ela ficou com a folha de jornal na mão e apercebeu-se que era a página da necrologia. Sem saber bem porquê os seus olhos quedaram-se numa fotografia de alguém que ela conhecia... a data do jornal era de alguns meses antes!

11 comentários:

Maria P. disse...

Que história!


Abraço*

Klatuu o embuçado disse...

Foda-se, andas gótico! :)

A ideia é excelente... isso precisa de umas tintas negras pelo meio.

JoAnInHa disse...

Bem...mas que historia...sim snhr, parabens! Beijos e passa no meu blog sp k kiseres =)

sofialisboa disse...

gostei! já te adicionei.sofialisboa

Bichodeconta disse...

Partidas que a vida nos prega.. Para ele , aquela mão na sua ficaria tatuada... Linda história, Um final que eu não gostaria de viver..um abraço..

irneh disse...

Olá Alexandre

Gostei de todas as tuas histórias. É um projecto muito interessante. A continuar, com energia.

Beijinhos

Vladimir disse...

a vida tem destas coisas...muito bem conseguida esta história, tal como todas as outras...

Bichodeconta disse...

Vinha em busca de mais uma história, só que hoje é dia de folia(pra alguns)claro! Mas volto mais tarde, já agora gostaria de acompanhar este projecto a que estás a dar vida e que na minha modesta prespectiva tem tudo para ser bem sucedido..um abraço..

Outonodesconhecido disse...

história com muito por desvendar, ou não...
Gosto deste novo espaço. Ando é com muito pouco tempo para a blogosfera.
Bjocas

BlueVelvet disse...

Meses antes???

Kalinka disse...

Li com atenção a história mas...

também pergunto o mesmo que a Blue Velvet:
...meses antes...???

explica se puderes!